quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Monitoramento eletrônico e o sistema prisional brasileiro

1.Introdução


A monitoração eletrônica é um método de controle da localização e do deslocamento de pessoas ou coisas, através do uso de tecnologias que se utilizam de ondas de rádio ou GPS (Global Positioning System).
“Em que pese podermos atribuir as origens do monitoramento eletrônico aos irmãos Ralph e Robert Schwitzgebel, que realizaram as primeiras experiências no ano de 1964, nos EUA, com dezesseis jovens reincidentes, podemos apontar o Juiz Jack Love, do Estado do Novo México, como sendo o precursor da idéia que, atualmente, vem sendo utilizada em vários países.
O mais interessante é que o Juiz Jack Love inspirou-se numa edição de Amazing Spider-Man de 1977, onde o rei do crime havia prendido um bracelete ao homem-aranha, a fim de monitorar seus passos pelas ruas de Nova York. Após ler a história, o Juiz Jack Love achou que a idéia poderia, efetivamente, ser utilizada no monitoramento de presos, razão pela qual procurou seu amigo Mike Gross, técnico em eletrônica e informática, a fim de persuadi-lo a produzir os receptores que seriam afixados nos pulsos, tal como havia visto na história em quadrinhos.
Em 1983, ou seja, aproximadamente 6 anos depois, após ter realizado, durante três semanas, testes em si mesmo com o bracelete, o Juiz Jack Love determinou o monitoramento de cinco delinqüentes na cidade de Albuquerque, a maior cidade do Estado do Novo México. Nascia, também, naquele momento, conforme nos esclarece Edmundo Oliveira, a National Incarceration Monitor and Control Services, a primeira empresa a produzir instalações eletrônicas destinadas ao controle de seres humanos.
Atualmente, existem quatro opções técnicas de monitoramento eletrônico, que podem ser adaptadas à pessoa em forma de: a) pulseira; b) tornozeleira; c) cinto; e d) microchip (implantado no corpo humano). Nas quatro hipóteses apontadas, a utilização pode ocorrer de maneira discreta, permitindo que o condenado cumpra a sua pena sem sofrer as influências nefastas do cárcere.”(grifei).
 A constatação e a conscientização dos efeitos maléficos do cumprimento das penas privativas de liberdades no sistema tradicional de cumprimento de pena – penitenciárias, outrora considerado o instrumento ideal de humanização das penas, segundo a concepção Iluminista liderada por Beccaria – impulsionaram alguns países à utilização do monitoramento eletrônico como eficaz alternativa no cumprimento da pena privativa de liberdade.
Os países anglo-saxônicos e nórdicos já utilizam o monitoramento eletrônico (intensamente) desde a década de 90 (do século XX). No final desta década, a Inglaterra já tinha mais de 50.000 pessoas controladas pelo sistema. Na Suécia, já havia cerca de 15.000 pessoas controladas (Gudín Rodriguez-Magariños). Também os Estados Unidos fazem uso dessa tecnologia há muito tempo.

2. Vantagens e Desvantagens da Monitoração Eletrônica
Baixo custo (se comparado ao presídio tradicional), evita a superpopulação carcerária (aplicação com prudência como medida substitutiva da prisão cautelar), evita o recolhimento de pessoas pouco perigosas junto a criminosos profissionais, possibilita que o condenado ou liberado trabalhe, que pague sua dívida com a vítima do delito, evita a dessocialização do presídio clássico, possibilita o controle da pessoa, evita o contágio criminógeno dos presídios, possibilita a ressocialização alternativa do condenado e é uma forma mais humana (em tese) de cumprimento de pena.
Outrossim, pode-se citar, ainda, como vantagens da monitoração eletrônica o seu papel de importante instrumento de segurança da ordem pública na progressão de regimes da pena, assim como a criação de situação benéfica e favorável à ressocialização do apenado na medida em que possibilita a este a convivência com a família, a sociedade, o trabalho e o lazer.
O emprego da monitoração eletrônica também ajuda a prevenir o crime e os desvios no cumprimento da pena imposta, contribuindo, assim, para um sistema penal eficaz sob o ponto de vista do papel constitucional do direito penal, qual seja, a garantia dos bens jurídicos e instrumento de realização de direitos fundamentais.
Lado outro, a monitoração eletrônica substitui o castigo físico da privação da liberdade pelo castigo moral e psicológico consistente na vigia constante e ininterrupta de suas atividades, o que, para alguns, configura verdadeira tortura mental.
No entanto, o principal argumento dos juristas que se posicionaram contra a monitoração eletrônica é a possível violação a direitos da personalidade, especialmente o direito à intimidade e à privacidade, uma vez que colocaria em exposição o condenado na medida em que todos poderiam visualizar a pulseira ou a tornozeleira eletrônica junto ao corpo do condenado. Contudo, ressalvados os direitos de não ser torturado e de submissão a trabalhos forçados, não há direitos absolutos.
Não se pode olvidar que a monitoração eletrônica, utilizada com parcimônia, adequação e proporcionalidade visa atender as finalidades da pena e, por conseguinte, favorece a proteção da dignidade da pessoa humana, quiçá diante de um juízo de ponderação entre os direitos aparentemente conflitantes em decorrência da sua aplicação – intimidade e finalidades da pena (retribuição, prevenção geral e especial e ressocialização).

3.Hipóteses legais previstas 
A pioneira previsão da monitoração eletrônica no Brasil ocorreu com a Lei nº 12.258/10, que possibilitou a aplicação da medida nas seguintes hipóteses:
Art. 146-B.  O juiz poderá definir a fiscalização por meio da monitoração eletrônica quando: (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
I - (VETADO); (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
II - autorizar a saída temporária no regime semiaberto;  (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
III - (VETADO); (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
IV - determinar a prisão domiciliar; (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
V - (VETADO); (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
Parágrafo único.  (VETADO). (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
Logo, duas são as hipóteses de monitoramento eletrônico – na prisão domiciliar e nas saídas temporárias no regime semiaberto.
As outras três hipóteses do texto original (vetados), incisos I, III e V e parágrafo único do art. 146-B da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, modificados pelo art. 2º do projeto de lei, previam:
“I - aplicar pena restritiva de liberdade a ser cumprida nos regimes aberto ou semiaberto, ou conceder progressão para tais regimes;”
III - aplicar pena restritiva de direitos que estabeleça limitação de horários ou de frequência a determinados lugares;”
V - conceder o livramento condicional ou a suspensão condicional da pena.”
“Parágrafo único.  Os usuários da monitoração eletrônica que estiverem cumprindo o regime aberto ficam dispensados do recolhimento ao estabelecimento penal no período noturno e nos dias de folga.”
  Essas hipóteses foram vetadas pelo Presidente da República, sob os seguintes fundamentos constantes da sua mensagem enviada ao Senado com as razões do veto:
“Razões dos vetos
A adoção do monitoramento eletrônico no regime aberto, nas penas restritivas de direito, no livramento condicional e na suspensão condicional da pena contraria a sistemática de cumprimento de pena prevista no ordenamento jurídico brasileiro e, com isso, a necessária individualização, proporcionalidade e suficiência da execução penal. Ademais, o projeto aumenta os custos com a execução penal sem auxiliar no reajuste da população dos presídios, uma vez que não retira do cárcere quem lá não deveria estar e não impede o ingresso de quem não deva ser preso.”
Logo, considerando que o veto não foi derrubado pelo Congresso Nacional, resta claro que a vontade do legislador é no sentido da inaplicabilidade do monitoramento eletrônico nas hipóteses vetadas, ou seja, no regime aberto, nas penas restritivas de direito, no livramento condicional e na suspensão condicional da pena, mas apenas nas hipóteses expressamente previstas no texto legal sancionado.
Sinteticamente, as razões de veto são: a) a contrariedade da aplicação do monitoramento eletrônico nas hipóteses vetadas à sistemática do cumprimento da pensa e à individualização da pena; b) os custos decorrentes da sua implantação.
Contudo, a pergunta que se faz é: são válidas as razões do veto presidencial no que tange à inaplicabilidade da monitoração eletrônica aos regimes semiaberto e aberto? Diante da situação caótica dos estabelecimentos penais, da sua superlotação, da falência do Estado no cumprimento de seus deveres como garantidor de direitos sociais existenciais mínimos e do crescente debate da sociedade em torno do tema a resposta, sob o prisma constitucional, evidentemente deve ser negativa.
Não se mostram válidas as razões de veto, pois a monitoração eletrônica possui custos inferiores ao sistema tradicional de cumprimento de pena em penitenciárias e atende aos fins da pena, ao tempo em que funciona como importante instrumento de humanização desta e de ressocialização, conforme anteriormente já dito.
Ocorre que a jurisprudência mais recente do STF e do STJ vem admitindo a aplicação da monitoração eletrônica em substituição aos regimes semiaberto e aberto quando não houver vagas ou estabelecimento adequado para o cumprimento da pena nesses regimes, para submeter o preso ao cumprimento da pena em prisão domiciliar cumulada com o uso da monitoração eletrônica.




























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